José Pereira Gonçalves é economista e sócio diretor da
Lisbon Consultoria Financeira e Participações Ltda e consultor da
Comissão da Indústria Imobiliária (CII) da CBIC
Depois
de cinco anos de retração, em 2019 o setor da construção civil
finalmente apresentou crescimento, tendo registrado resultado positivo
de 2%, enquanto o crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) ficou em
cerca de 1%.
Esse resultado, apesar de não ser considerado
expressivo, foi comemorado por marcar o início de um novo ciclo de
expansão do setor que, nos próximos anos precisará recuperar cerca de
30% para voltar ao mesmo nível alcançado em 2014.
Vários foram os
fatores que levaram à expansão do setor da construção, com destaque para
os sinais positivos em relação à estabilidade econômica como
decorrência do processo de aprovação, pelo Congresso Nacional, de
algumas reformas consideradas essenciais para dar segurança aos
empresários como um todo e em especial aos da construção civil, com
destaque para a Reforma Previdenciária, considerada fundamental para o
governo atingir o equilíbrio fiscal.
O processo de redução da taxa
de juros do Brasil que, no final do ano atingiu o menor índice
histórico da Taxa Selic (4,5% ao ano), também foi fundamental para a
melhora da atividade da construção civil, na medida que viabilizou a
redução significativa das taxas de juros oferecidas pelo sistema
financeiro nos financiamentos imobiliários, permitindo a inclusão de uma
massa significativa de pessoas com condições de tomar crédito.
Nos
últimos meses do ano, os volumes das contratações realizadas pelos
agentes que atuam no Sistema Brasileiro de Poupança e Empréstimo (SBPE)
atingiram níveis próximos ao auge do SBPE alcançado em 2014, fazendo com
que o volume de crédito de 2019 superasse em mais de 30% o total de
contratações de 2018 e alcançasse mais de R$ 76 bilhões, envolvendo a
construção e a aquisição de cerca de 290 mil unidades.
No que se
refere às contratações com recursos do Fundo de Garantia do Tempo de
Serviço (FGTS), apesar das discussões havidas em relação ao novo modelo
do Fundo, iniciadas com a Medida Provisória 889, cujas modificações
foram consolidadas na Lei 13.932 e sobre o Programa Minha Casa Minha
Vida (PMCMV), pode ser afirmado que os resultados também foram
positivos, na medida em que a quase totalidade dos recursos alocados no
orçamento resultou em contratações efetivas. Em 2019, o volume de
recursos envolvendo operações habitacionais alcançou cerca de R$ 56,4
bilhões, que adicionados ao montante de recursos concedidos a título de
descontos totalizaram mais de R$ 65 bilhões, envolvendo cerca de 524 mil
unidades.
Além do comportamento das contratações com recursos do
SBPE (caderneta de poupança) e do FGTS, a confiança de que o setor da
construção está entrando numa nova fase de expansão também pode ser
comprovada pelo desempenho apresentado pelas empresas listadas na Bolsa
que integram o segmento. Em 2019, o IMOB (índice que mede o desempenho
das ações das empresas do setor da construção) teve variação de 70,6%,
numa clara demonstração de que o mercado acredita que o segmento deve
continuar a apresentar resultados positivos.
Além desse indicador,
em 2019 também mereceu destaque o comportamento da rentabilidade do
IFIX – índice que congrega os principais Fundos de Investimento
Imobiliário (FII), tendo em vista ter alcançado 36%, enquanto o Ibovespa
variou 31,58%.
O
desempenho das empresas do segmento da construção na Bolsa de Valores
permitiu o acesso de algumas delas a recursos do mercado de capitais,
reduzindo seus níveis de endividamento e deixando-se com nível de caixa
mais folgado, para desenvolver novos empreendimentos. Além disso, também
gerou o interesse de um novo grupo de empresas que já manifestou
posição de que pretende entrar nesse mercado em 2020, depois de mais de
10 anos, tendo em vista o último IPO do segmento ter ocorrido em 2009.
Merece
registro também a manifestação de representantes do segmento da
construção de que os resultados positivos deverão ser mantidos, conforme
apurado pelo Índice de Confiança do Empresário da Construção (ICEI),
captado pela pesquisa da Confederação Nacional de Indústria (CNI), cujo
indicador de dezembro de 2019 registrou 63,1 constituindo-se no segundo
melhor resultado desde 2011.
Diante desse cenário de expectativas
positivas é de se esperar que o setor da construção efetivamente entre
em novo ciclo de expansão. No entanto, deve ser lembrado que existem
algumas incertezas em relação ao comportamento que as duas principais
fontes de recursos destinadas ao segmento habitacional devem apresentar.
No
caso do FGTS os números indicam que a arrecadação líquida entre 2020 e
2022 deve ser negativa, com os recursos disponibilizados para novas
operações devendo manter os mesmos níveis nominais de 2019. No que se
refere ao SBPE, com a Taxa Selic nos níveis atuais, a competitividade
das cadernetas está muito comprometida, não será surpresa se for
registrado um período em que os saques superem os novos depósitos.
No
entanto, se efetivamente a captação de recursos por intermédio das
contas de poupança não for suficiente para atender a demanda do mercado,
o sistema poderá acionar outros instrumentos (CRI, LCI e LIG) para
captar os recursos necessários, mesmo que os custos sejam um pouco mais
elevados, em comparação aos que foram praticados em 2019.
A
retomada da expansão do setor da construção é de importância fundamental
para a economia, tendo em vista os setores envolvidos e sua elevada
capacidade de absorção de mão de obra, contribuindo para o
equacionamento de um dos principais problemas do país está enfrentando
que é o elevado nível de desemprego. Dessa forma, se acredita que não
faltarão medidas e correções de rumos para fazer com que o ciclo de
crescimento que foi iniciado em 2019 seja mantido por período mais longo
possível.
O tema tratado tem interface com o escopo do projeto ‘Melhorias para o Mercado Imobiliário’ da Comissão da Indústria Imobiliária (CII) da Câmara Brasileira da Indústria da Construção (CBIC).
Fonte: Cbic